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Eu não durmo


Eu não durmo, respiro apenas como a raiz sombria 
dos astros: raia a laceração sangrenta, 
estancada entre o sexo 
e a garganta. Eu nunca 
durmo, 
com a ferida do meu próprio sono. 
Às vezes movo as mãos para suster a luz que salta 
da boca. Ou a veia negra que irrompe dessa estrela 
selvagem implantada 
no meio da carne, como no fundo da noite 
o buraco forte 
do sangue. A veia que me corta de ponta a ponta, 
que arrasta todo o escuro do mundo 
para a cabeça. Às vezes mexo os dedos como se as unhas 
se alumiassem.
(...) Nunca sei
onde é a noite: uma sala como uma pálpebra negra
separa
a barragem da luz que suporta a terra.
(...)


Herberto Helder, Walpurgisnacht

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