Avançar para o conteúdo principal

Pedaços de mim na fala dos outros #39


a parte do teu corpo
que procura pelo sol
como os gatos pela casa
a parte que permanece imóvel
quando cantas, aquela que se move
quando estás parado
a parte que apenas a mim
e de relance, por descuido
revelaste
a parte onde guardas as memórias
de infância, a parte que ainda anseia
pelo futuro
a parte que demora
a acordar
depois que acordaste
a parte que discorda
ainda de mim
quando já cedeste
aquela que adere
mais fortemente
ao teu nome
a parte que guarda
silêncio enquanto
falas
a parte que
quando estás cansado
ainda não se cansou
a parte ainda noturna
quando é dia, diurna
quando é noite
a parte que
tem parte
com o mar



Ana Martins Marques

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Divagação #3 (sobre quartos)

O lugar perfeito para escrever sobre um quarto que seja seu, é na casa de outros. O dia propício, é aquele que inicia com um superior de hierarquia familiar a colocar-te  no lugar que, segundo ele, te pertence - o da obediência à sua vontade. Já repeti que por vezes os livros nos são tão próximos, que não há o que escrever sobre eles. Ou haverá, apenas não lhe sentimos a necessidade; são mais sentidos que pensados, se o posso dizer. Um quarto que seja seu , de Virginia Woolf, apesar de tudo, não é um desses. Não sei se existirão muitos livros que se aproximem com tanta perspicácia de questões que já coloquei sobre um assunto específico, de situações gritantes ou subtis das quais já me apercebi. Que retrate mesmo parte da minha realidade exterior. E ainda assim, leio-o sem grande emoção. Se calhar mesmo porque já pensei no mesmo; porque a situação da mulher na sociedade vem-me sendo mostrada a partir de casa, porque tenho bons exemplos das dificuldades colocadas às mul...

Solstício

(fonte aqui) O dia mais longo.

Da beleza #7

Na origem da beleza está unicamente a ferida, singular, diferente para cada qual, escondida ou visível, que todos os homens guardam dentro de si, preservada, e onde se refugiam ao pretenderem trocar o mundo por uma solidão temporária mas profunda. Fora de miserabilismos. A arte de Giacometti parece querer revelar essa ferida secreta dos seres e das coisas, para que ela os ilumine. Jean Genet , in O Estúdio de Alberto Giacometti Alberto Giacometti no seu estúdio em Paris (fonte aqui)