O problema é que por vezes, não há o que falar.
Ficas a olhar a folha verde tenro que apareceu nos dias em que estiveste fora, e calas-te, como se para a ouvir falar-te em silêncio.
(Silêncio, sempre o silêncio. Lugar onde se guardam as palavras-tesouro.)
E tudo parece demasiado - as palavras que ouves nas conversas da rua e as que respondes; as palavras que ouves e lês na informação saturada das redes sociais, nos jornais, noticiários, colunas de opinião, na vaidade alheia.
Parece que apenas os livros te dão uma sensação de segurança e conforto, o último lugar onde a fala ainda diz.
Mas as próprias palavras já se diluíram no tempo. Ou melhor, sob os passos dos milhões de vozes que as usaram, que as misturaram com outras, as modificaram, as interpretaram traindo-as.
E queres desdobrar-te em degraus pelo passado fora, ao estilo da Verónica de Eliade, e entender as palavras antes de terem sido esvaziadas, quando eram vivas e poderosas.
Porque pensas como o mago que Quignard menciona no Vida Secreta:
Um mago da antiga Caldeia (Oráculo Caldeu CL, 103) prescreve que nunca se traduzam as palavras antigas para não perderem a sua força. Não se domesticam as feras. O verbo que o mago caldeu utiliza é allaxés. Trata-se de não tornar allos (outra) a matéria da linguagem que se revelou eficaz na sua origem.
...e queres conhecer a origem, queres aprender a falar.
...e queres conhecer a origem, queres aprender a falar.
Aprendes a falar falando menos.
A única fala que não perdeu poder é o silêncio. Aprende a falar traduzindo silêncios.
A única fala que não perdeu poder é o silêncio. Aprende a falar traduzindo silêncios.
E não ter o que falar, deixa de ser problema.
as palavras podem ter perdido o valor, e as sensações poderão ter ficado orfãs de significado, e eternamente apreendidas num inevitável silêncio, por não haver como as dizer.. mas por outro lado, existe o paradoxo, de teres escrito tudo da forma como escreveste, com essas mesmas orfãs palavras.. e nessa sequência.. e de repente parece que, na verdade, quase nada falta mesmo às palavras..
ResponderEliminarEscreve-se com as palavras que restam, já que outras se perderam. E ainda assim, escreve-se.
EliminarÉ um tema que não se esgota, que me cativa e questiona. Para mim é um mistério, se posso dizê-lo.
Mas gosto especialmente do que diz Quignard - que escrever é o mais próximo que existe do silêncio (não estou a citar).
escrever é de facto o mais próximo do silêncio..
ResponderEliminarfico a pensar se as palavras se vão esvaziando, e se pensamos e sentimos nós com as palavras que temos... não será a epidémica superficialidade uma inevitabilidade..
Já me fiz essa pergunta.
EliminarMas inevitável não será. Se o pensamento criou as palavras, haverá sempre esperança. ;)
bem visto..........
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